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Artigo Técnico – HRN (Hazard Rating Number) na Norma NR-12 Eficácia X Obrigatoriedade

23 de outubro de 2023

Continue lendo o artigo pela revista Proteção de Março de 2020, ou seja Assinante da Revista.
Revista Proteção, Edição 339, Março2020. Páginas 70 à 77.

Grande é o universo de máquinas e equipamentos em nosso imenso Brasil, de Norte a Sul. Contamos com uma diversidade incontável de processos e produtos, com grandes corporações rompendo fronteiras internacionais a pequenos negócios locais. E para atender a esta demanda, é imprescindível a utilização de muitas máquinas. “Ahhh, as máquinas…” Não me canso de admirá-las. Foram tantas evoluções ao longo de séculos. O engenheiro?! É este o que costumo atribuir como o psicólogo das máquinas e equipamentos. É ele que as entende tão bem quando estão em dias difíceis, quando não compreendidas, quando precisam de sua atenção e carinho. Afinal, as máquinas tem sim sentimentos! Desta área profissional remete (depende) o bom funcionamento, desempenho, força, produtividade e saúde eletromecânica para manter em segurança também àqueles que as operam: Os operadores, mecânicos e eletricistas…

Mas deixemos os sentimentos de lado. Voltarei logo mais a alguns elementos descritos acima.

Hoje quero trazer para uma análise mais profunda, e que possa gerar polêmica, um tema que nos últimos três anos tem trazido diversas dúvidas e questionamentos. A utilização por parte de diversos profissionais da engenharia da utilização de uma famosa ferramenta de estimativa de riscos chamada HRN (Hazard Rating Number). A HRN e um método qualitativo e quantitativo que permite, de forma resumida, indicar prioridades na tomada de decisão para a seleção de dispositivos na aplicação de sistemas de segurança em máquinas e equipamentos. Inevitavelmente, e sim, estamos falando da Norma “NR-dozeeeeeeeeeeee”.

Este artigo trata de algumas das dificuldades encontradas por empresas de diversos portes e atividades quanto a utilização da HRN, da sua obrigatoriedade legal e referencial por diversos requisitantes, e dos equívocos cometidos por alguns profissionais legalmente habilitados. Não é intuito desta obra tratar a HRN como obsoleta ou desnecessária na avaliação dos riscos existentes em máquinas e equipamentos, mas sim o de confrontar a efetividade do método e sua obrigatoriedade como referencial técnico nos documentos no que se refere única e exclusivamente a Norma NR-12. Todo o processo aqui descrito se refere à máquinas encontradas já no processo produtivo, ou seja, usadas. Para projetos novos ou em desenvolvimento, outros métodos e normativas devem ser utilizadas para satisfazer a estimativa e quantificação de riscos e perigos.

Antes de dar continuidade, é preciso salientar que a HRN é exigida e muito aplicada na fase de elaboração de análise e apreciação de riscos de máquinas e equipamentos por parte de consultorias, auditores fiscais, gestores, engenheiros, técnicos e empresas usuárias de máquina das mais variadas atividades industriais e comerciais. Ela é um requisito obrigatório no escopo, de muitas usuárias de máquinas, para a contratação de empresa especializada na elaboração de documentos para a NR-12 e condição de desqualificação quando não atendida.

Em uma época que data da última grande atualização da Norma NR-12, uma intensa demanda por consultoria para atendimento da norma NR-12 se iniciou com a publicação da Portaria SIT N° 197 de 17/12/2010. Lembro-me muito bem quando o diretor de uma grande indústria plástica em que trabalhei por mais de uma década entrou em minha sala, atirou um maço de folhas em cima da mesa de trabalho, e em tom de enorme preocupação disse: “Toma aqui, lê tudo isso e comece a proteger os dedos dos trabalhadores nos empilhadores de copo”. Era a NR-12 caindo no meu colo. Foi um momento tenso na empresa, entendi de imediato que algo estava acontecendo e que eu poderia fazer parte desse trabalho. Não parou mais. Eu adorei o desafio. Sempre gostei de interpretar normas e traduzi-las para a realidade. Nesse período tudo era muito obscuro e alguns métodos de elaboração de análise de riscos foram necessários para atendimento da NR-12. Inicialmente consultorias consagradas iniciaram a elaboração dos primeiros documentos utilizando-se da HRN e que foram então aos poucos sendo assimiladas pelas demais consultorias espalhadas pelo país. Além da HRN, também na época a NBR 14009 era uma norma já bem utilizada na apreciação e redução dos riscos, onde eram descritos alguns métodos de análise de perigos e estimativa de riscos.

A HRN se mostrou um bom método de quantificação dos riscos potenciais em máquinas e equipamentos, pois priorizava as adequações com dispositivos de segurança nos pontos mais críticos ou àqueles que tinham históricos de acidentes em parques fabris com centenas de máquinas. E de fato, quando falamos em recursos financeiros alocados para as adequações na casa dos milhões de reais, era necessário que o dinheiro fosse consumido de maneira planejada e programada. E a HRN dava aos gestores que receberiam a documentação apresentada pelas consultorias, um rumo importante nessas adequações.

O formato básico da ferramenta HRN consiste no resultado do produto de quatro variáveis conforme indicado nas tabelas abaixo e segundo a seguinte equação:

Figuras 01, 02, 03, 04 e 05 (veja abaixo as tabelas da ferramenta HRN)

Segundo pesquisas realizadas, a HRN teve suas primeiras aparições na década de 1990 no Reino Unido em um artigo técnico de Chris Steel (as fontes de pesquisa são indicadas no fim deste texto).O resultado encontrado prioriza a ação sobre o risco encontrado em cada parte da máquina ou conjunto de máquinas, e cabe ao gestor da NR-12 realizar a adequação quanto aos riscos mais relevantes e graves para a segurança dos operadores ou equipes de manutenção elétrica e mecânica. Ressalto aqui a segurança das equipes de manutenção, pois em algumas análises e apreciação de riscos, estes profissionais são ignorados e ficam suscetíveis à acidentes com as máquinas.

Em quase 10 anos de estudos e aplicações com a Norma NR-12 e todo arcabouço de normas técnicas nacionais e internacionais harmonizadas, pude perceber que dois tipos de empresas seriam atingidas com as exigências para segurança em máquinas e equipamentos: Empresas de médio a grande porte e empresas de pequeno porte (ME e EPP) quando não de “fundo de quintal”. Outros grupos são importantes, porém para este artigo, estes dois são fundamentais para um perfeito entendimento do problema.

Pois bem, quando falamos em empresas de grande porte, equipes internas com técnicos e engenheiros dão suporte constante e altamente especializado quando as documentações com os riscos e perigos de máquinas são apresentados pelas consultorias. Estas quase sempre depois de finalizados os contratos com as análises e apreciação de riscos, partem para outros trabalhos e não podem dar um acompanhamento constante ao cliente. Absolutamente normal essa prática pois o mercado funciona assim. Entra então os seguintes personagens: técnicos e engenheiros internos que farão a interpretação dos resultados e priorização dos riscos pela HRN para as posteriores adequações das máquinas. E assim o trabalho continua sob orientação dos técnicos.

Mesmo assim, os gestores internos de segurança e medicina do trabalho de grandes empresas não são especialistas em segurança de máquinas, e precisam traduzir os complicados documentos de análise de riscos para as equipes de manutenção e terceiros que farão as adequações de cada uma das máquinas. Para que esse processo seja mais rápido, é preciso que os documentos para atendimento da NR-12 sejam simples e precisos quanto aos dispositivos e sistemas de segurança a serem utilizados. E aqui se vê a falta de eficácia no uso da HRN. Ela é apenas um indicativo de prioridade e quantificação dos riscos, mas não a solução para a adequação da máquina. Se fosse para indicar as prioridades e tamanhos dos riscos, a equipe interna da empresa tem muito mais discernimento que um consultor externo. A reciproca não é sempre verdadeira.

Porém quando falamos das pequenas empresas, estamos tratando diretamente com proprietários e gestores não especializados como os engenheiros ou técnicos das grandes empresas. Cansei de ser atendido por proprietários em suas bermudas, chinelos e sem EPIs. Estes pequenos empresários precisam agora se debruçar e interpretar o que as complexas análises de riscos apresentam em suas páginas. Gráficos e cálculos de priorização dos riscos saltam aos olhos em códigos, termos técnicos complicados e referências aos 156 itens e 12 anexos da NR-12 que causam mais confusão do que trazem soluções. Para dar alguns exemplos: interface de segurança, monitoramento, categoria 3 ou 4, reset, redundância, PH, burla, intertravamento, blocos de segurança, riscos adicionais, comando bimanual, capacitado, qualificado, habilitado, entre muitos outros termos.

Nesse sentido, o cliente que deve adequar seu contingente de máquinas de produção, fica entre duas alternativas: mantem o foco naquilo que mais sabe fazer que é fabricar e vender seu produto e assim continua faturando, ou, assume o trabalho de contratar mecânico e eletricista, comprar materiais, acompanhar a instalação dos dispositivos e sistemas de segurança em cada máquina, acompanhar as visitas nos órgãos fiscalizadores e fazer assim a gestão desse trabalho até o fim com risco de autuações e interdições quando não cumpridas as exigências da NR-12. Isso tudo no mais alto linguajar técnico, descritos passo a passo, nos documentos arduamente pagos aos consultores.

Desta forma, os métodos adotados pela maioria esmagadora das consultorias em NR-12, não passam de meras formalidades “para fiscal ver” e dão ao empresário o sentimento de recurso desperdiçado e descontentamento por não visualizar um horizonte de eventos finais.

A metodologia aplicada nos documentos com a ferramenta HRN não trazem resultados satisfatórios para a adequação das máquinas por um motivo muito simples: o cliente não necessita saber qual parte da máquina deve ser atendida com prioridade, mas sim qual solução se espera do especialista em NR-12 (contratado com enorme resiliência) para que aquele risco existente na máquina seja mitigado. Até por que em termos de prioridade e grandeza do risco existente em cada máquina de sua fábrica, o próprio cliente compreende, por histórico de acidentes e pela visualização no dia a dia na fábrica. Ele necessita saber quais proteções físicas (fixas ou móveis) devem ser aplicadas, com quais materiais, distâncias seguras, componentes eletroeletrônicos intertravados, acionamentos seguros, comandos de parada de emergência, sinalizações de orientação segura, procedimentos a serem adotados pelos operadores e equipe de manutenção, e demais dispositivos e sistemas de segurança.

E aqui abro outro parênteses nessa análise: Encontramos consultorias que apresentam na etapa de análise e apreciação de riscos, apenas a indicação dos riscos e suas prioridades. Chamam este documento de diagnóstico ou inventário. Deixando para uma outra etapa, a elaboração do “projeto” com a solução final para adequação completa da ou das máquinas existentes no parque fabril. O cliente que contrata a consultoria em NR-12, mesmo sem entender a complexidade da norma, espera então receber o caminho para que torne suas máquinas seguras, e na medida do possível, produtivas e com adequações econômicas. Dos 156 itens base da Norma NR-12, não encontramos referência para documentos que não sejam o inventário e a análise e apreciação de riscos. Puro conhecimento advindo do estudo constante das normas para segurança em máquinas.

Evidentemente, devemos ter vários documentos auxiliares no processo de implantação da Norma NR-12. Mas de longe é a visualização de gráficos que variam do verde, passando pelo amarelo até o vermelho, que o cliente usuário final da máquina espera receber. Ele precisa economizar recursos e receber a solução para o problema de falta de segurança em suas máquinas. Seja com a documentação da consultoria, seja com a automação industrial implementada e efetivada na máquina.

Cabe ressaltar aqui, que como autor deste artigo, tenho aplicado, entendido e compreendido que o atendimento da norma NR-12 numa máquina qualquer ou do parque fabril de máquinas, passa por seis etapas nesta sequência lógica:

1. Inventário de máquinas e equipamentos para gestão da NR-12;

2. Análise e apreciação e redução de riscos;

3. Projetos elétricos e mecânicos;

4. Adequação da máquina conforme etapas 2 e 3;

5. Capacitação de operadores e equipes de manutenção após a adequação, e;

6. Validação dos sistemas e dispositivos de segurança através de um laudo de conformidade.

Não entraremos nas particularidades dos itens descritos acima (um novo artigo quem sabe!?). Mas ressalto que a maioria dos profissionais não compreende estas etapas no processo de implantação da NR-12, lamentavelmente, e por isso aqui destaco categoricamente, o fato destes mesmos profissionais utilizarem de forma tão indiscriminada e ineficiente a tão copiada e não compreendida HRN em seus documentos.

Pelo exposto nas linhas anteriores e entendida as dificuldades, os entraves e complexidade da tradução dos resultados da HRN para algumas empresas, passaremos para o próximo objetivo: A falta de referencial técnico para a utilização da ferramenta HRN na implantação da NR-12 numa máquina qualquer. Não há citações em nenhum dos 156 itens da NR-12, seus anexos, portarias, resoluções, normativas técnicas nacionais e internacionais, a obrigatoriedade de utilização da HNR como método para estimativa de riscos em máquinas.

Porém, todo profissional legalmente habilitado que atuar na consultoria da Norma NR-12, deverá utilizar-se também da Norma ABNT NBR ISO 12100:2013 para determinar um método, avaliação e procedimentos para redução dos riscos existentes em cada parte de uma máquina ou conjunto de máquinas. Evidentemente, para quem pensou que a norma 12100 traria uma referência para a HRN, vasculhou suas quase 100 páginas em vão. Ao menos pode-se dizer que já teve algum contato com essa norma primordial para entendimento de perigos e riscos no processo de trabalho com máquinas e equipamentos.

Novamente, ressalto o objetivo deste artigo que é o de apenas questionar a efetividade e obrigatoriedade da utilização da HRN como única forma de apresentação dos resultados para uma análise e apreciação de riscos. E mais, a eficácia deste e de qualquer outro método que apenas utilize a quantificação e priorização de riscos.

O que se observa na elaboração dos documentos referentes à apreciação de riscos em máquinas e equipamentos é a utilização única e exclusivamente da aplicação da ferramenta HRN com agregação da norma NBR ABNT 14153 que permite a determinação da categorização dos dispositivos e sistemas de segurança a serem utilizados nas máquinas (quando não indicados para proteções puramente mecânicas). Quem realmente compreende as normas de segurança em máquinas e equipamentos saberá o que este parágrafo quis dizer.

A utilização da HRN como método de quantificação e priorização dos riscos deve ser adotada e explorada sempre que possível pelos engenheiros, porém adequada ao contexto e realidade de nossas industrias, onde na maioria dos profissionais que farão a interpretação dos resultados são pessoas não qualificadas, ou que não trabalham diretamente com normas de segurança, termos técnicos complexos ou ferramentas desse tipo, por mais simples que sejam. Estes profissionais utilizarão estes documentos para compor todo o processo de gestão e auditoria da Norma NR-12 no parque fabril. Não é incomum encontrarmos técnicos e até mesmo engenheiros que não compreendem as análises e apreciação de riscos entregues pelas consultorias.

Devemos como engenheiros, sempre que possível produzir trabalhos técnicos de alto nível, que busquem a qualidade e boa técnica. Porém é nossa obrigação dar orientação aos clientes e técnicos usuários finais das máquinas, com uma linguagem próxima, agradável, eficaz, que atinja o público alvo e que apenas tenham referenciais na própria norma NR-12 ou suas normas harmonizadas.

Walter Luís Künzel / CEO e Fundador da B&K Engenharia / Engenheiro Mecânico e especialista na Norma NR-12

Colaboração: Gerson Rodrigues / Proprietário da E8 Brasil / Especialista em Sistemas de Segurança de Máquinas / CMSE TÜV Nord

Referências de pesquisa e estudo:

[1] Norma NR-12, portaria MTb n° 1.083, de 18/12/2018

[2] Norma ABNT NBR 14153

[3] Norma ABNT NBR 14009

[4] Norma ABNT NBR ISO 13849

[5] ABNT ISO/TR 14121-2:2018

[6] https://www.shponline.co.uk/wp-content/uploads/2015/06/Steel-article-1990.jpg

[7] https://www.linkedin.com/pulse/28-anos-do-hrn-hazard-rating-number-mas-qual-%C3%A9-sua-ronaldo/